64 #sexagésimo
quarto gole
 
Oi queridos,
tudo bem?
 
Nos meus 15/16 anos, quando eu estudava pro vestibular e sonhava com um futuro promissor na carreira que eu escolhera, eu jamais adivinharia que quando essa época chegasse, ela seria a mais solitária da minha vida. 
 
Tínhamos tantos sonhos enquanto anotávamos a aula de matemática no caderno / “puxa, como serei eu nos meus 35, absolutamente realizada, e com a vida em ordem?” / pois a minha vida em ordem tem bem menos gente, barulho e telefonemas que duram horas, do que eu imaginava. 
Crescer nos levanta cedo da cama e pergunta: “Você sabia que ser adulto era assim, um silêncio absoluto?"
 
Envelhecer e morar sozinha é muito mais sobre a gente com a casa, com os objetos e as calçadas, do que com os vínculos. Acordar e tomar café por vezes em pé, na pia da cozinha mesmo. Repetir o café. Rolar o dedo pelos tweets que se criaram na madrugada. Escolher a roupa do dia. Pentear o cabelo. Falar com ninguém. 
Sair pra trabalhar, cumprimentar desconhecidos que sorriem na portaria de prédios, dentro dos táxis, na fila do self-service. 
 
Não vejo as festas como eu via até um pouco antes da pandemia. Algo mudou pra mim. Hoje vou nos lugares de multidão e acho tudo pequeno, não me preenche mais. Pessoas sorrindo pro nada, postando fotos para, em 3 segundos, aquele story desaparecer. E já fui muito, mas este ano não me conectei com o carnaval. 
  
O tempo vai nos desvinculando da imensidão de gente que carregamos aos 18 anos. E aqui falo de mim, mas isso pode significar algo pra você também. Cada um segue seu trilho. Muitos se casam, se agregam, têm filhos, enchem a casa de amigos. Pra mim foi diferente. Eu me acostumei com, na maior parte do tempo, estar em minha companhia. 
 
Acho que ainda assino jornal impresso porque ele me conecta à estudante sonhadora que fui na faculdade de jornalismo - que queria ser independente. Só não sabia que ser independente significava ser sozinha. Envelhecer faz dos vínculos profundos que tenho -  pais e irmãs - envelhecerem também. E o tempo é brabo, traz clareza até demais. A gente se despede. Desacredita de religiões. Faz menos amizades. Fica exausta de se apaixonar.  
 
Sobre encontros amorosos, aliás….justifiquei tanto quem eu era em todos eles, que às vezes me pergunto se eu era realmente aquilo que eu dizia ser, ou se só estava tentando convencer a pessoa a ficar / / entrega pra Deus, tem coisa que não é pra ser mesmo. 
 
Quem somos nós depois que crescemos? Será que a gente se transforma em uma pessoa desiludida dos sonhos que criou ou é do próprio crescimento ir descobrindo que o tempo desmancha conexões? 
 
Quanto maiores ficamos, mais lúcidos estamos. 
E a lucidez, meus caros, é a vida - em que às vezes você rola o feed, e não tem ninguém. Que a gente sempre tenha a sabedoria de poder recorrer a nós mesmos, sempre que preciso. 
 
Fiquem bem <3 
 
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Um beijo,
Volto logo.
 
 
 
 
Um rascunho perdido
(textos meus escritos em algum lugar do passado)
 
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São Paulo, faculdade de jornalismo. Algum dia entre 2005 e 2008.
Tempo de óculos, aula de fotografia e de muita gente por perto, todos os dias.

Clara Vanali

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Sobre
 
Sou jornalista de formação, tenho uma produtora de vídeos como ocupação, mas aqui, nestes goles,  eu apenas escrevo. 
 Prazer, Clara Vanali ;)