68 #sexagésimo
oitavo gole
 
Oi queridos,
tudo bem?
 
Numa sala de espera, aguardando um entrevistado chegar, estávamos eu e a assessora dele. Nos cumprimentamos e sentamos cada uma numa poltrona, com seus respectivos celulares. Achei que ela não quisesse interagir e, por um momento, até agradeci silenciosamente, já que poderia ficar no meu mundo virtual. Mas aí ela levantou a cabeça e perguntou: - quando você começou a fazer vídeos? 
 
Caceta, fazia tanto tempo que alguém não perguntava do meu início. 
Comecei a contar meio que resumidamente porque não sabia o quanto ela estava afim de ouvir, mas então a percebi realmente interessada, o que me fez resgatar várias etapas do meu caminho, desde escrever pro jornal da cidade de Araçatuba até vir pra São Paulo e morar 1 ano e meio num quartinho de um pensionato com a minha irmã. E fui falando meio como quem conta uma história de outra pessoa, só que era a minha história…meu primeiro trabalho não-remunerado, depois o estágio TV Universitária, o emprego na tão sonhada Editora Abril…..passei por algumas pessoas que abriram caminhos, pela minha primeira matéria em vídeo e quando percebi, me vi ouvindo minha história em voz alta. 
 
Vocês já ouviram a história da vida de vocês em voz alta?
 
Às vezes a gente se critica tanto, pensando nas vias paralelas que pegou ou deveria ter pegado, mas não para pra ouvir o tanto de coisa legal que viveu. 
 
E falando ali, em voz alta, senti vontade de entender a história dela também. 
- Me conta você agora como veio parar aqui. 
E o celular já não parecia mais interessante porque a nossa conexão em contar a própria história uma pra outra nos fez lembrar o quanto é importante a gente valorizar a própria estrada. Os perrengues, os desvios, a coragem, as escolhas, as pessoas que somaram e até as que subtraíram…o amadurecimento das experiências que, só falando em voz alta pra gente se permitir valorizar. 
 
Fiquei com orgulho da minha história e com orgulho da história dela. Percebi que pra ela também foi algo novo se ouvir dessa forma, como quem abre as próprias cartas na mesa e começa a repassar tudo o que já superou pra chegar onde está. 
 
Fiquei pensando que às vezes a gente procura tanto um sinal do universo, do tarô, da astrologia, do céu, pra que ele mostre por onde a gente tem que andar, mas esquece que, até agora, sobrevivemos bem. A gente caminhou no escuro todo esse tempo e fez uma trajetória linda, sem saber o que estava por vir, mas encarando o que apareceu e o que escolheu.  
 
Você leitor/leitora que me lê nesta manhã de terça-feira, comece a falar a própria história em voz alta. Tire do papel, esvazie a cabeça. Descarregue a culpa e os arrependimentos. Pense no tanto de gente legal que cruzou seus dias. Nos trabalhos que te fizeram ter orgulho das suas escolhas. Nos amigos que vieram e deixaram uma saudade boa. Nos amores que dividiram garrafas de vinho. Na sua família massa que acolhe e diverte. Nos problemas que conseguiu vencer. Nas suas atitudes de amor que fizeram e fazem com que você tenha uma história incrível e foda pra compartilhar. 
 
Fiquem bem <3 
 
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Em especial, você pode gostar do gole 49.
 
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Um beijo,
Volto logo.
 
 
 
Um rascunho perdido
(hoje com o trecho do livro ”Os Íntimos" de Inês Pedrosa )
 
Image item
Pensamentos de Afonso, um dos personagens:
Não sei porquê, de repente senti que havia ali um clima. Éramos amigos há anos, e nunca se tinha passado nada. Naquela noite olhei pra ela de outra maneira. Subimos aos nossos respectivos quartos e eu telefonei-lhe, perguntei-lhe se podia ir ter com ela ao quarto. Ela respondeu-me: "Já bebeste demais. Não." E a coisa teria ficado por ali, se não fosse um pequeno comentário dela, na manhã seguinte, quando nos cruzamos ao pequeno-almoço. Disse-me: "Olha, eu ontem disse-te que não, porque de facto tinhas bebido muito. Mas não fiquei zangada contigo". De modo que, nessa noite, só bebi água. Ao fim da noite fui dizer-lhe de novo. E ela disse-me que subisse ao quarto dela. A verdade é que, se não fosse aquela pequena frase, eu nunca mais teria me aproximado dela com intenções sexuais, e a história teria terminado antes de começar. As nossas vidas decidiram-se naquela frase irrelevante.
 
E quem é que nunca teve um momento da vida resolvido em uma frase irrelevante?

Clara Vanali

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Sobre
 
Sou jornalista de formação, tenho uma produtora de vídeos como ocupação, mas aqui, nestes goles,  eu apenas escrevo. 
 Prazer, Clara Vanali ;)