59 #quinquagésimo
nono gole
 
Oi queridos,
como vocês estão?
 
É muito bom ressignificar momentos da vida em que, na hora, parecia um abismo sem porta, mas que depois de um tempo, olhando de longe, a gente se entende com o eu do passado.
 
Anos atrás, quando eu fiquei bem doente, me lembro de, um certo dia, ter ido ao Mercadão de São Paulo com meu pai e irmãs, e na volta pra casa, 
ter pegado um táxi em que, no rádio, tocava Drão. Chovia muito e olhando pra janela, vendo a vida que seguia lá fora (apesar da minha estar paralisada), Gilberto Gil cantava "o amor da gente é como um grão, tem que morrer pra germinar". Pensei, naquele instante, que talvez eu estivesse morrendo ali pra também germinar depois. É difícil acreditar em qualquer coisa quando se está no fundo, mas talvez a música estivesse sendo tocada pra mim (acredita, você vai germinar). Pois embora a minha germinação estivesse muito distante naquela tarde chuvosa, meses depois ela veio, e meu novo eu grão nasceu.
 
Pois 1 mês atrás, numa viagem linda a trabalho em Pernambuco, estava com uns amigos num restaurante em Recife, quando começou a tocar Drão. E eu me emocionei. Me emocionei porque quis dar a mão pra Clara do passado que estava morrendo na primeira vez que a escutou e que, agora, feliz, podia provar com o próprio exemplo que sim, às vezes o amor tem que morrer pra germinar. E no meu caso, foi o amor da minha família que me regou, que cuidou e que teve a paciência de que um dia eu voltasse. É reconfortante ouvir novamente uma música que, na época, foi tocada nos meus piores dias e, hoje, é tocada pra lembrar que não desistimos.
 
Fiquei pensando nisso porque a vida é feita de altos e baixos eternos. Alguns leves, outros pesados. Alguns lutos por perdas. Algumas perdas por quem nem morreu, mas faz falta. Algumas doenças. Muitas decepções. Alguns choques de realidade que colocam por água abaixo tudo o que a gente acreditou uma vida….

Pois sim, iremos morrer muitas vezes ao longo dessa trajetória em que trabalhamos, estudamos, buscamos sonhos, conhecemos pessoas, geramos filhos e fazemos planos. Não tem peneira. A dor uma hora chega. Mas uma das coisas que eu aprendi (embora deteste dizer que sofrimento traga aprendizado) é que, por vezes, a gente germina de novo. Vem alguém e coloca terra, água, cuida, olha, pega na sua mão e te ajuda. Alguém que acredita mais do que você e que, pela insistência, faz você acreditar também.
 
Drão é só uma música. Mas que ressignificou um momento pra mim e me mostrou que tem muito amor dentro da gente. Nas pauladas dos dias, a gente quase se esquece que pode amar e que outras pessoas podem nos amar tanto. O amor é um trem gigante. Às vezes ele passa e a gente perde. Mas sempre vem outro pra podermos nos agarrar. 
 
Que apesar de todas as nossas mortes, a gente possa germinar depois.

Fiquem bem <3 
 
E se você gostou desse texto, dá uma passada lá no 18º gole. 
 
Um beijo,
Volto logo.
 
 
 
Um rascunho perdido
(textos meus escritos em algum lugar do passado)
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Catanduva. Casa da vó. Algum dia de dezembro em 1996.
Uma época sem iphones, ipads ou ipods. Apenas fita cassete e walkman.

Clara Vanali

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Sobre
 
Sou jornalista de formação, tenho uma produtora de vídeos como ocupação, mas aqui, nestes goles,  eu apenas escrevo. 
 Prazer, Clara Vanali ;)