75 #septuagésimo
quinto gole

 
Oi queridos, tudo bem?
(as palavras em azul são todas links clicáveis)
 
Andando de carro pelas ruas de Araçatuba, meu pai e eu começamos a cantarolar Samba em Prelúdio. 
 
Eu sem você não tenho porquê
Porque sem você não sei nem chorar
Sou chama sem luz, jardim sem luar
Luar sem amor, amor sem se dar
 
E eu sem você sou só desamor
Um barco sem mar, um campo sem flor
Tristeza que vai, tristeza que vem
Sem você meu amor eu não sou ninguém
 
A gente gosta dessa nossa tradição: cantarolar tristezas que fazem do nosso caminho alegre. 
Em casa sempre teve música brasileira. Minha mãe ouvia Emílio Santiago. Meu pai Milton Nascimento. Minha mãe Leila Pinheiro. Meu pai MPB4. E na mistura de um gostar mais de um ou de outro, a gente escutava de tudo.
Na quase vida adulta, quando eu me mudei pra São Paulo, achei que lá finalmente descobrira o que era era arte e cultura. Estudar a cena política do país no curso de jornalismo, ter acesso a peças de teatro no meio da rua, a cinemas ali na Augusta ou na Gazeta, conhecer a gastronomia de cozinhas variadas, passear por sebos ao redor da faculdade….finalmente um mundo se abrira pra mim. 
 
E sim, de fato. 
Mas até hoje, quando penso em cultura, ou em que parte a cultura teve o seu papel mais importante na minha vida, eu fecho os olhos e lembro da gente na salinha da minha casa antiga em Araçatuba, ouvindo as águas de março fechando o verão. 
A primeira vez que escutei Atrás da Porta fiquei imaginando a cena da mulher se agarrando à pele e pelos do marido enquanto ele a deixava chorando. Soube esses dias, aliás, que Chico Buarque terminou de escrever essa canção num saco de pão após o Roberto Menescal musicar toda a melodia e levar a fita k7 na casa dele, no meio da noite, pedindo: chico, a elis quer que você termine a letra dessa música porque ela vai gravá-la. Elis, quando recebeu a letra, não conseguia cantar sem chorar. Tiveram que regravar várias vezes pra, no disco dela, a versão vir sem lágrimas. 
 
A bossa nova tem dessas de usar barquinhos e beijinhos pra falar de amor. E também não mede sofrimento pra cantar desamor. 
Amigo é pra essas coisas sempre me ganha pela dureza da honestidade: 
 
Salve! - Como é que vai? - Amigo, há quanto tempo! - Um ano ou mais - Posso sentar um pouco? - Faça o favor - A vida é um dilema - Nem sempre vale a pena - Pô... - O que é que há? - Rosa acabou comigo - Meu Deus, por quê? - Nem Deus sabe o motivo - Deus é bom - Mas não foi bom pra mim - Todo amor um dia chega ao fim. 
 
E a beleza da cadência dessa bossa samba hit em Como Dizia o Poeta que afirma e reafirma que a vida só se dá pra quem se deu, se jogou e se entregou a uma paixão: 
 
Quem já passou por essa vida e não viveu,
Pode ser mais mas sabe menos do que eu.
Porque a vida só se dá pra quem se deu,
Pra quem amou, pra quem chorou, pra quem sofreu.
 
Quem nunca curtiu uma paixão
Nunca vai ter nada, não.
 
Abre os teus braços, meu irmão, deixa cair. 
Pra que somar se a gente pode dividir. 
Eu francamente já não quero nem saber.
De quem não vai porque tem medo de sofrer.
 
Memória pura. Meus dias com meus pais. 
E a maior riqueza que me apresentaram até hoje. A música do Brasil que me acolheu e me deu os caminhos para construir a minha vida, meu trabalho e vivenciar a cultura em todas as suas possibilidades. 
Às vezes a gente valoriza tanto o que alcançou depois de que se tornou independente e foi morar sozinho na cidade grande…pois eu não me canso de celebrar, com carinho, o que me apresentaram lá atrás, quando os sonhos apenas começavam. 
 
Fiquem bem <3 
 
Todos os goles passados estão disponíveis para leitura lá:  www.claravanali.com.br 
Em especial, você pode gostar do gole 55. 
 
Quer receber essa news toda semana?
Assine grátis! 
 
Um beijo,
Volto logo.
 
 
 
Um rascunho perdido
(textos meus escritos em algum lugar do passado)
 
Image item

Anos 90. Minhas festas de aniversário em Araçatuba. Nessa, eu devia estar fazendo uns 13 anos. E o que me encanta nessa foto são tantas coisas, que eu vou tentar descrever pra não perder nada. A quantidade de plantas da minha mãe penduradas no teto e nas paredes. A televisão de tubo. As cadeiras clássicas daquela época. 
A felicidade desabando nos nossos rostos. Eu, no meio, de branco e saia jeans. 
Taí uma coisa que nunca mais usei, branco e saia jeans. 
Gente e muita gente perto. O aniversário mais popular da escola feito no quintal de casa.
 Melhores amigos. Pra onde seguiram tantos caminhos? 

Clara Vanali

Instagram
Facebook
 
Sobre
 
Sou jornalista de formação, tenho uma produtora de vídeos como ocupação, e aqui, nestes goles, eu apenas escrevo. 
 Prazer, Clara Vanali ;)