85 #octogésimo 
quinto gole
 
Oi queridos, tudo bem?
 
Minha irmã me escreveu esses dias que comprou um leite de rosas. O mesmo que minha avó usava quando era viva. Ela abriu o frasco, cheirou e chorou.  
O perfume a levara para aquela casa, para aquela sala e para a mesa central da cozinha, quando nos juntávamos para contar histórias que faziam minha avó chorar de dar risada. E se tem uma coisa que lembra ela e aquela casa é minancora, pastilha valda e leite de rosas. 
 
Lembrei do velório dela em 2008. Foi num cemitério bonito numa cidadezinha perto de Catanduva. Enquanto ela era velada por conhecidos e desconhecidos, fiquei olhando aquele monte de túmulos na minha frente, pensando que nossa vida tinha acabado naquela manhã. Com a morte dela, a nossa infância morrera junto. E a esperança de que pessoas especiais não morrem, também.
 
Uma frase dita pela irmã da minha avó, no entanto, salvou os meus anos dali pra frente. Vendo nosso desolamento e tristeza profunda, ela (uma senhora bem despachada) chegou pra minha mãe e disse: Sorte a dela que já foi, e a gente que ficou?
 
Isso foi meu salvamento. Parei de achar que era terrível ela morrer e perder o tanto de vida que ainda teria pela frente, e me agarrei a acreditar que ruim mesmo era pra nós que ficamos, com toda essa braveza dos dias pra suportar _então que bom que você se livrou vó, vai em paz que a gente vai sofrer mais um pouco nesse mundo aqui. 
 
Já se foram 15 anos desde que ela se morreu e eu nunca me esqueci dessa frase. Toda vez que lamento por ela ter ido tão cedo, tento me consolar pensando que ela se poupou do sofrimento_sorte a dela que já foi, e a gente que ficou?  
 
Acho que a tristeza da vida vai tirando a doçura da gente. 
Minha irmã, no mesmo dia em que comprou o leite de rosas, me disse que tem esperança de que um dia a gente encontre a minha avó, em algum plano espiritual, interestelar, universal, paralelo, infinito. Pensei a respeito e disse: 
 
_não vamos mais encontrá-la, melhor aproveitarmos quem amamos neste momento mesmo. 
 
Fiquem bem <3 
 
Todos os goles passados estão disponíveis para leitura lá: www.claravanali.com.br 
Em especial, você pode gostar do gole 84 (é permitido parar de procurar). 
 
Um beijo,
Volto logo.
 
 

Clara Vanali

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Um rascunho perdido
(textos meus escritos em algum lugar do passado)
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Acho bonito colocarmos um ponto final em fases da vida. A gente pode agradecer por ter vivido aquilo e entender, dentro do nosso coração, que foi. 
Fui numa festa de carnaval esse fim de semana. Me achei bonita de glitter. O cabelo solto até a altura do peito. O delineado preto só no cantinho do olho. Tava com vontade de me fantasiar. Pra mim. Pra me lembrar de quem eu sou além das roupas de academia e de escritório.
Mas carnaval, de fato, passou pra mim. Era muita gente, muito cigarro, tive medo de pisarem no meu pé, da música alta me dar zunido no ouvido, de contrair alguma pereba no banheiro compartilhado, do prédio pegar fogo e eu não conseguir sair porque todo mundo ia me atropelar lá dentro. 
Definitivamente a vida social que eu almejo hoje é uma mesa no quintal, com os mesmos amigos queridos que me acompanharam no carnaval, um vinho fresco gelado e uma massinha com tomate e manjericão.
 
_Obrigada festas com música alta, DJs, multidões e suor, por tudo o que vocês proporcionaram nas minhas experiências e histórias.
Me despeço com amor e aceito que não me encaixo mais aí.
 
Sobre
 
Sou jornalista de formação, tenho uma produtora de vídeos como ocupação, e aqui, nestes goles, eu apenas escrevo. 
 Prazer, Clara Vanali ;)